PARIS – O jornal “New York Times” publicou na quinta-feira (08) reportagem sobre um técnico de computação de 41 anos, que se tornou uma espécie de Edward Snowden do setor bancário. Num bistrô parisiense em meio a um clima de filme noir, Hervé Falciani contou aos jornalistas do “NYT” Doreen Carvajal e Raphael Minder que foi caçado por investigadores suíços, preso por autoridades espanholas e até sequestrado por agentes israelenses do Mossad, que queriam obter os dados que ele roubou quando trabalhava para o banco HSBC em Genebra.
— Estou fraco e sozinho — reclamou Falciani, protegido 24 horas por dia por uma escolta de três guardas-costas, oferecidos pelo governo francês, pois corre risco de vida por ser o único capaz de decifrar os dados encriptados em cinco CD-ROMs, contendo dados de quase 130 mil correntistas, no que poderá se tornar a maior quebra de sigilo da história bancária da Suíça.
Apesar dos percalços de quem está em fuga desde 2008, Falciani vive dias de herói, e ele próprio se vê como uma espécie de anjo que trouxe redenção contra o pantanoso mundo das contas numeradas da Suíça. Ele vem sendo inclusive paparicado por governos europeus, em busca de recuperar recursos perdidos em sonegação e corrupção:
— Na Suíça, os bancos são tão organizados que conseguem dar a volta nas novas regras e leis para continuar permitindo a evasão fiscal.
Ele é acusado por críticos, em especial representantes do HSBC, de ser um manipulador movido mais por dinheiro do que por idealismo. Os dados que ele vazou — segundo críticos, vendeu — desde 2008 provocou uma tsunami no mundo bancário, com reflexos também nos altos escalões políticos da Europa. Suas informações serviram de base para a chamada “Lista Lagarde”, que inclui políticos e representantes de oligarquias gregas, que sonegaram impostos depositando milhões na Suíça. Seus dados também ajudaram a Espanha a recuperar € 260 milhões em impostos e identificar mais de 650 sonegadores, inclusive o presidente do Banco Santander.
No ano passado, Falciani repassou seus dados para as autoridades americanas, que investigou se o HSBC foi conivente com esquemas de lavagem de dinheiro. Essa investigação acabou levando o banco a aceitar o pagamento de US$ 1,92 bilhão, num acordo fechado em dezembro.
Muitos ricos e poderosos esperam para ver quais serão os próximos passos de Falciani, que afirma que apenas uma pequena parte dos dados foi desencriptada e usada.
Desde que foi solto da prisão este ano, após um juiz espanhol ter negado à Suíça o pedido de extradição, Falciani, que é casado e tem uma filha pequena, reapareceu na França. Autoridades ofereceram proteção em troca de depoimento a procuradores locais, que investigam se o HSBC ajudou clientes franceses a sonegar impostos.
— Minha meta principal é ajudar às autoridades a criar um mecanismo de defesa — disse ele. — Estamos sob ataque e perdendo muito dinheiro de imposto.
Nascido em Mônaco e educado no Sul da França, Falciani trabalhou no HSBC. Em 2005 foi promovido e transferido para Genebra. No ano seguinte, ele alertou seus superiores sobre uma falha no sistema de computação do banco, que permitia a violação dos dados de privacidade dos correntistas. Ele foi ignorado e começou a colher os dados metodicamente, num esforço para mostrar que o sistema era vulnerável. O banco, porém, nega que ele alguma vez feito tal alerta e acredita que ele obteve os dados no período de dois anos e que sua intenção sempre foi vender os dados.